Com base em determinação da Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH), o ministro Reynaldo Soares da Fonseca, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), concedeu liminar em habeas corpus para determinar que a 1ª Vara Regional de Execução Penal de Recife desconsidere a restrição imposta pelo Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) e promova o exame do pedido de contagem de pena em dobro feito por um homem que esteve preso no Complexo Prisional do Curado (PE).
O habeas corpus apresentado ao STJ questionou acórdão do TJPE que, ao analisar incidente de resolução de demandas repetitivas, entendeu não se aplicar a remição de pena por superlotação carcerária aos condenados por crimes contra a vida, a integridade física ou a dignidade sexual, assim como por crimes hediondos ou equiparados.
Em novembro de 2018, uma resolução da Corte IDH determinou que fosse contado em dobro cada dia de pena cumprido pelos detentos no Complexo do Curado, e que, no caso dos condenados por crimes contra a vida ou a integridade física e crimes de natureza sexual, uma equipe profissional realizasse exames criminológicos para indicar a conveniência ou não da contagem em dobro, ou sua aplicação em menor medida.
A defesa do paciente – que, entre outros delitos, cumpre pena por tráfico de drogas, crime equiparado a hediondo – sustentou que o TJPE, além de descumprir os termos da resolução da Corte IDH, violou a jurisprudência do STJ e do Supremo Tribunal Federal (STF).
Sentença da Corte IDH tem caráter obrigatório e vinculante
O relator, ministro Reynaldo Soares da Fonseca, explicou que o acórdão do TJPE impugnado no habeas corpus negou vigência “ilegalmente” à resolução da Corte IDH quando rejeitou a contagem em dobro para os presos do Complexo do Curado condenados por crimes contra a vida ou a integridade física ou crimes de natureza sexual, e ainda estendeu a vedação “aos reclusos acusados ou condenados por crimes hediondos ou equiparados”.
O ministro lembrou que as turmas de direito penal do STJ (RHC 136.961; HC 649.938), e também o STF, consideram que as sentenças emitidas pela Corte IDH têm eficácia obrigatória e vinculante, além de produzir autoridade de coisa julgada internacional, com eficácia direta para as partes, sendo que todos os órgãos e poderes internos do país se encontram obrigados a cumpri-las.
Ao conceder a liminar, o ministro determinou ao juízo de execuções penais competente que promova o imediato processamento e o exame do pedido de cômputo de pena em dobro apresentado pela defesa, desconsiderando a restrição aos crimes equiparados a hediondo.
Violações aos direitos humanos no Complexo do Curado
Em agosto deste ano, a presidente do STJ, ministra Maria Thereza de Assis Moura – na época, corregedora Nacional de Justiça –, deu prazo de oito meses para o TJPE reduzir em 70% a população do Complexo Prisional do Curado, uma das maiores unidades prisionais do país.
A medida prevê a redução da lotação do Curado, que era de 6.509 pessoas no dia 15 de agosto, quando foi iniciada a correição extraordinária do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) na justiça criminal e no sistema prisional de Pernambuco. A previsão é que, quando for atendida a determinação, cerca de 4,5 mil homens deixem a unidade.
A decisão da ministra Maria Thereza se baseou nos direitos da pessoa presa assegurados na Constituição Federal, na Convenção Americana de Direitos Humanos e na Lei de Execução Penal (Lei 7.210/1984).
As medidas contidas na decisão da Corregedoria Nacional de Justiça atendem, em parte, às determinações da Corte IDH ao Brasil, por conta das repetidas violações aos direitos humanos cometidas ao longo da última década no Complexo do Curado.