Apelidos ofensivos motivam rescisão indireta e indenização a trabalhador imigrante

Decisão proferida na 8ª Vara do Trabalho do Fórum da Zona Sul-SP acatou pedido de rescisão indireta de trabalhador e condenou empresa da área de energia a indenizar por danos morais em razão de apelidos pejorativos e preconceituosos. O montante referente ao assédio foi estipulado em quatro vezes o último salário da vítima.

De acordo com os autos, o sócio da instituição costumava chamar o reclamante de “Vera Verão”, em alusão a personagem de programa televisivo que era negra e homossexual. O superior hierárquico também apelidou o subordinado, de “macici”, que na língua haitiana, idioma materno do autor, significa “homossexual”. Além disso, o chamava de “negro gay” e “preto gay”. O tratamento era reiterado e ocorria perante os colegas.

Na ação, o empregado alegou que os insultos se perpetuaram no tempo e tornaram o ambiente de trabalho “insuportável”, causando-lhe, até transtornos de ordem psiquiátrica. A empresa negou os fatos e argumentou que não houve denúncia pelo trabalhador às autoridades policiais, setor de recursos humanos do estabelecimento ou superiores.

Em audiência, testemunha ouvida a convite do autor relatou que o referido sócio tinha problemas com todos os trabalhadores por causa de apelidos, piadas e ofensas. Confirmou ainda as denominações dadas ao colega e disse ter presenciado “brincadeiras” várias vezes ao longo do dia. A testemunha patronal também afirmou que o sócio em questão fazia piadas com os funcionários e que era comum chamar o reclamante de “macici”. Declarou que tais fatos ocorreram algumas vezes durante o horário de trabalho e nos momentos de descontração.

A juíza prolatora da sentença, Tarcila de Sá Sepúlveda Araújo, considerou que a prova testemunhal deixou claro o “tratamento jocoso, preconceituoso e desrespeitoso” do sócio para com os trabalhadores, inclusive o reclamante. Ela destacou que o caso deve ser analisado sob a lente da interseccionalidade, principalmente por “ser o reclamante preto e imigrante”. Analisou ainda que se trata de “evidente hipótese de racismo recreativo”, cabendo julgamento com base na Resolução 598/2024 do Conselho Superior de Justiça, além de princípios constitucionais e da Convenção nº 111 da Organização Internacional do Trabalho.

Para a magistrada, o superior “tenta, em forma travestida de piada, dissimular uma agressão, uma ofensa à honra”. E concluiu que a utilização de estereótipos com a finalidade de desqualificar o trabalhador no ambiente laboral configura ofensa aos direitos de personalidade e caracteriza grave descumprimento de obrigações por parte da ré.

Confira alguns termos usados no texto:

jocoso  que zomba
racismo recreativo deboche ou piadas ofensivas disfarçadas de humor direcionadas às minorias raciais
Resolução 598 do CNJ

estabelece diretrizes para adoção de Perspectiva Racial nos julgamentos em todo o Poder Judiciário

Convenção nº 111 da OIT trata da discriminação em matéria de emprego e profissão e visa a promover a igualdade de oportunidades e tratamento no trabalho, proibindo discriminação com base em critérios como sexo, raça, religião, idade, deficiência, entre outros

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