Família ganha indenização por desistência do Dnit na desapropriação de imóvel na Ilha dos Marinheiros (24/08/2023)

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A 10ª Vara Federal de Porto Alegre determinou que o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) pague indenização por danos morais à família proprietária de um imóvel na Ilha dos Marinheiros. O bem foi declarado de utilidade pública para a construção da nova ponte do Guaíba e entrou nas ações de desapropriações, mas a autarquia desistiu dele três anos depois. A sentença, publicada na segunda-feira (21/8), é da juíza Ana Maria Wickert Theisen.

Mãe e dois filhos ingressaram com o processo buscando indenização por danos morais e materiais. Narraram que funcionava um hotel no imóvel, que operou normalmente até 2018, mas que, em janeiro de 2016, uma portaria declarou o prédio como de utilidade pública e, então, pararam de fazer investimentos no negócio.

Segundo os autores, no final de 2017, encerraram as atividades do hotel, dispensando quase todos os funcionários, mantendo apenas dois guardas. A ação de desapropriação do imóvel iniciou em janeiro de 2018, tendo as audiências de conciliação não sendo exitosas, pois não concordaram com o valor ofertado. Em agosto de 2019, o Dnit desistiu da expropriação.

Em sua defesa, a autarquia federal argumentou que os autores decidiram fechar o hotel de forma precipitada, em 2016, diante de uma mera notícia de uma provável desapropriação, pois já deveria ser deficitário o negócio. Afirmou que, durante a ação de desapropriação, os proprietários dispõem da posse e liberdade de usufruto do imóvel até que o Dnit seja imitido na posse do bem desapropriado, o que não ocorreu.

Desapropriação

Ao analisar o caso, a juíza federal substituta Ana Maria Wickert Theisen pontuou que a desapropriação é uma forma de intervenção estatal na propriedade. “Trata-se de procedimento complexo, de caráter compulsório, que culmina no despojamento do patrimônio, mediante justa indenização”. Ele possui uma fase administrativa que realiza estudos e análises para avaliar a necessidade da desapropriação, a determinação de seu impacto social, a declaração de utilidade pública, a estimativa do valor indenizatório e sua previsão orçamentária.

Segunda a magistrada, a partir da declaração de utilidade pública, começa a correr o prazo de cinco anos para o início da fase judicial, que visa garantir os efeitos jurídicos do instituto, ou seja, a extinção dos direitos do expropriado sobre o bem e a aquisição dos direitos pelo expropriante. “O procedimento tem caráter compulsório, isto é, o expropriado não pode se opôr ao fato da expropriação, permitindo-se somente a discussão sobre seu valor”.

Theisen destacou que “o particular fica totalmente à mercê do Poder Público quando um imóvel é objeto de desapropriação. Ademais, o procedimento é longo, podendo ultrapassar cinco anos, gerando inegáveis transtornos e prejuízos. Por isso, deve o Administrador agir com toda a cautela nas fases iniciais do procedimento, evitando dar andamento a desapropriações que venham a se mostrar inúteis. Ainda assim, haverá casos em que a situação que determinou a imposição da desapropriação se modifique, impondo a desistência do processo”.

Em relação ao imóvel pertencente aos autores da ação, a juíza sublinhou que transcorreu um prazo de três anos e sete meses entre a declaração de utilidade pública e desistência da desapropriação por parte do Dnit. “Ao longo desse tempo, houve incerteza sobre o destino do imóvel. Resta caracterizado ato da administração potencialmente danoso ao administrado”. É preciso, de acordo com ela, averiguar sobre a concretização dos danos e sobre o nexo de causalidade entres estes e o ato da ré.

Danos materiais

Observando as provas apresentadas nos autos, a magistrada concluiu que, apesar de ser presumível que o procedimento de desapropriação tenha contribuído para o fim da empresa, não ficou comprovado que tal fato tenha sido, por si só, determinante para tal desfecho. A diminuição no número de funcionários do hotel iniciou antes de 2016 e não foi comprovado que, nos anos anteriores, tenham feito investimentos no empreendimento. “O que se percebe é que a empresa já vinha em declínio há bastante tempo (desde 2013, pelo menos), e que a decisão de não investir no negócio (se houve) pode ter sido até mesmo anterior ao decreto expropriatório”.

Dessa forma, para ela, a expectativa de desapropriação pode até ter acelerado o processo de encerramento das atividades do hotel, mas não se pode afirmar que tenha sido a causa determinante. Assim, não cabe o pagamento de danos materiais.

Danos morais

Para a configuração do dano moral, segundo a juíza, “é necessária a demonstração de violação a um direito subjetivo trazendo ao indivíduo transtornos que superem os simples dissabores da vida cotidiana”. O que é o caso presente nesta ação.

“Ora, o particular, ainda que deva submeter-se à decisão do Poder Público, tem o direito de supor que a mesma foi refletida e que a interferência em sua vida e em sua propriedade decorre de uma necessidade efetiva. Por isso, a desistência, depois de anos, ainda que permitida, traz consequências, as quais vejo traduzidas no caso por um dano de ordem emocional, apto a ser indenizado”.

Theisen julgou parcialmente procedente a ação determinando que o Dnit pague R$ 100 mil aos autores. Cabe recurso da decisão ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

 

Secos/JFRS (secos@jfrs.jus.br)

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